domingo, 14 de outubro de 2012

Uma última vez



Era um sábado. As luzes da cidade haviam começado a ascender. Ela pegou a pá do quintal, uma caixa que costumava guardar embaixo da cama, a lanterna e saiu de casa. Foi pra um lugar esquisitinho que ficava no meio da cidade. Não havia muita coisa lá, só árvores e mato. Teve um pouco de medo de entrar ali, mas mesmo assim o fez. Não iria gastar meia hora de viajem em vão. Tratou de andar em direção àquela árvore grande que ficava perto da ponte com a lanterna na mão e um frio imenso. Cada passo que ela dava significava algo que estava deixando para trás, não era só da estrada que ela se afastava. Era de toda uma história. Tudo ali tinha uma história. O som do riacho, o canto tranquilo do pássaro, as folhas douradas que caiam no chão. Tudo lhe dizia alguma coisa. Só que ela não iria parar, estava mesmo decidida a isso. 
Não demorou a encontrar o que estava procurando, a árvore grande e larga que tinha dois nomes marcados, e as lagrimas caíram. Fazia tempo que ela não via aquelas marcas. Fazia tempo que ela não via nem ouvia aquele nome. Forçou-se a olhar pro outro lado e encher-se de coragem. Não podia parar, não agora. Segurou firme a pá e começou a cavar um buraco ao pé da árvore. Cada pouquinho de terra que ela conseguia tirar era um pedaço seu que ia embora, uma lágrima que caia, uma lembrança que retornava. E ela precisava cavar mais fundo. Cavou. Pegou a caixa de metal, sentou ali mesmo e ficou parada. Ela não conseguia se mexer. Não conseguia encarar a árvore. Não conseguia não lembrar. Então abriu a caixa. Só mais aquela vez. Só mais essa.
Todas as cartas estavam ali, endereçadas, com selos e cartões postais. Todas as fotos, os presentes, as letras de música, a corda do violão dele que ela havia estourado, a última mensagem de voz. Estava tudo ali. E tudo gritava uma lembrança. E como doía. Como tudo isso sangrava em seu peito. Ela leu cada carta que terminava com “eu te amo”, ouviu sua voz pela ultima vez, acrescentou na caixa o anel que ele a havia dado e fechou a caixa. Colocou-a dentro do “pequeno túmulo” e jogou a terra por cima. Era a última vez.

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